Cada vez parece mais claro que o galego só terá soluçom por duas vias
complementares: a primeira, e principal, da mao de umha afirmaçom
coletiva em termos de poder político soberano; a segunda, a nível da
chamada política lingüística, tirando-o das maos dos filólogos e
professores de língua ou, no mínimo, alargando as decisons na matéria ao
conjunto de cientistas sociais.
É sabido que a ciência social foi artificalmente parcelada em áreas
autónomas para, precisamente, provocar o atual afastamento entre cada
umha dessas esferas da totalidade que juntas constituem. História,
economia, política, lingüística, filosofia, direito, antropologia…
nenguma dessas áreas do conhecimento é compreensível à margem das
restantes. Porém, o sistema de pensamento dominante pretende fazer de
cada umha delas um universo isolado, reduzido a um saber apresentado
como técnico, neutro e indiscutível.
Parece desnecessário afirmá-lo, mas é o caráter social que constitui
as sociedades humanas, sendo precisamente a maneira específica como a
nossa espécie incide na natureza através do trabalho o que nos torna
umha espécie humana. Em funçom desse caráter fundante do fator social,
nem a economia, nem a política, nem a lingüística fam o menor sentido se
forem estudadas e aplicadas à margem do caráter social intrínseco a
todas elas.
Poderíamos dar exemplos sobre como os economistas pretendem
vender-nos a sua doutrina como asséptica e alheia à política, ou da
falsa objetividade histórica com que os estados puxam a brasa à sua
sardinha, vendendo como “científicos” projetos vulgarmente ideológicos…
mas fiquemos com a que agora nos interessa: o ámbito da lingüística.
Durante décadas, temos assistido na Galiza a umha discussom acesa
entre defensores da orientaçom reintegracionista do galego e valedores
da sua constituiçom em língua diferenciada e afastada do português. Um
debate em que os filólogos assumírom especial protagonismo para
defenderem com critérios técnicos umha ou outra opçom.
Na verdade, por trás de ambas, ficárom sempre claras duas visons
integrais do que a Galiza deveria ser: um apêndice de Espanha (em versom
unitária, autonómica ou federal) ou um sujeito político soberano.
A primeira visom adapta-se melhor ao isolacionismo antiportuguês, e
como tal tem sido promovida até hoje polo poder político vigorante na
Galiza. A segunda permite romper os vínculos ortográficos e a
referencialidade cultural de Espanha, abrindo-nos para as culturas que
no mundo se expressam na nossa língua, contando com um incontestável
aval histórico.
Se limitarmos o assunto aos termos filológicos, qualquer das vias
será possível, sempre que formulada com umha mínima coerência interna,
mas os resultados práticos socialmente contrastáveis serám opostos.
Fatores sociais, económicos, políticos e históricos combinam-se para
determinar que o isolacionismo conduza –como já tem feito– para umha
institucionalizaçom autonómica da secular hispano-dependência. Esses
mesmos fatores dam ao reintegracionismo um rol fundamental para marcar
umha distáncia de segurança frente ao dominante mundo espanhol,
favorecendo a construçom de um espaço lingüístico-cultural próprio.
Nom foi por acaso que o autonomismo institucional imperante nas
últimas quatro décadas optou por alimentar e adotar o isolacionismo.
Tampouco foi casual a tendência mais reintegracionista dos minoritários
setores soberanistas, sendo o independentismo o principal responsável
pola defesa e divulgaçom social da prática reintegracionista.
A AGAL tem sido desde os primeiros anos 80 o principal sustento
científico de umha visom sempre ligada a umha proposta integral que
podemos denominar nacionalitária. Sem compromissos partidaristas
concretos, a construçom nacional tem tido no trabalho da AGAL umha das
frentes a nível de recuperaçom da língua própria, fornecendo
legitimidade e ferramentas práticas para a atividade de um crescente,
embora minoritário, movimento social reintegracionista.
Entretanto, nos últimos anos, pareceria que parte da sua dirigência
experimente umha deriva sempre presente nalguns setores do que
genericamente podemos chamar “galeguismo”, mas também no
reintegracionismo: umha desconexom progressiva e consciente de qualquer
vínculo entre língua e naçom. Tendência essa preocupante, ligada em
ocasions a certo elitismo inteletual e desligada das dinámicas sociais
mais ativistas.
É verdade que a situaçom do idioma, expressom da situaçom do País, é
hoje de umha profunda gravidade, com umha acelerada perda de falantes e
de presença inclusive em ámbitos onde no passado recente tinha
conseguido estar presente. Sendo mais que preocupante, nom é essa umha
situaçom irreversível, como alguns dirigentes da atual AGAL parecem
concluir quando assumem, na prática, que só nos resta reduzir o nosso
ativismo à demanda de introduçom do português no ensino como língua
estrangeira próxima, tomando a Estremadura espanhola como modelo.
A conseqüência dessa visom, se se confirmasse, poderia reduzir as aspiraçons desse reintegracionismo a agir como lobby alternativo ao ILG, à procura da legitimidade do poder autonómico atual.
Isso seria tam legítimo como triste.
Que se pretenda argumentar em termos técnicos ou filológicos umha tal
rendiçom estratégica, através da “superaçom” da norma galega proposta
pola AGAL há mais de 30 anos, é inassumível para quem ainda acredita na
Galiza como realidade nacional viável. É a visom ideológica de quem
desiste do labor que deu sentido histórico ao reintegracionismo. Um
labor que tem como aval a legitimidade que dá o trabalho dos movimentos
sociais que utilizam o padrom galego.
Apoiar toda a presença possível do português na Galiza é, mais do que
saudável, imprescindível. Porém, o caminho para isso nom é renunciar à
construçom de um padrom nacional próprio, inserido no ámbito lusófono,
em pé de igualdade com o de Portugal e o do Brasil. Foi para isso que a
AGAL nasceu, como parte desse segmento da sociedade galega que nom
renuncia à sua construçom como comunidade nacional plena e emancipada.
É esse o critério que dá sentido e vigência à norma da AGAL, e nom
qualquer argumento técnico sobre as possíveis escolhas ortográficas.
É imprescindível considerar a nossa comunidade lingüística para além
do “corpus lingüístico”, de maneira social e em funçom de projetos
coletivos. Daí que começássemos por reivindicar o caráter
multidisciplinar de qualquer política lingüística, ao invés da
estratégia “filologista” que vem sendo aplicada na Galiza.
Até hoje, quem defende a viabilidade da Galiza como naçom fai-no
incorporando o galego como parte substancial do projeto de construçom
nacional. Se assim nom for, o espanhol irá consolidar-se como língua
própria e o galego nom passará de um enfeite ou recurso de livre
escolha, como cada vez mais é.
A atual dirigência da AGAL apresenta-nos como exemplo do seu novo
modelo o contexto valenciano no contexto dos Países Cataláns. Nom
parece ser precisamente esse o exemplo mais representativo de umha
atuaçom bem sucedida. Nós contrapomos a necessária construçom de um
padrom próprio, como tenhem feito todos os grandes espaços lingüísticos
na sua articulaçom nacional. Poderíamos citar casos de sucesso como o
alemám nos cantons suíços ou o francês no Quebeque, para nom indicarmos
outros mais evidentes como o hispano ou o anglófono; até porque, ao
invés do caso catalám, ninguém na Galiza aspira a constituir uns “Países
Lusófonos” que justificassem um “padrom flexível” único.
Eis a articulaçom que defendemos para o galego. Dar tanta presença
quanto possível às variantes lusitana e brasileira no nosso país é
necessário, mas nom deve desviar-nos do principal objetivo: umha Galiza
soberana com umha língua plenamente normalizada, sob a forma de um
padrom reintegrado próprio.
Como em todo o mundo.
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