martes, 21 de xullo de 2015

Fagim: «O que escrevo é para tornar evidente o que as instituições ocultam»

«O livro é atual porque os argumentários, quase sempre lugares comuns, descansam no possibilismo, essa doença de quem ninguém está a salvo».
 No ano 2001, Valentim Fagim publicou O galego (im)possível, um livro que logo se converteu em referência para uma geração de reintegracionistas. Quinze anos depois vê a luz O galego (im)possível. Ainda mais, revisão daquele marcante trabalho. O autor explica nesta entrevista o que mudou no livro… e o que mudou na Galiza neste tempo.
Foi necessário fazer muitas correções para adequar O galego (im)possível. Ainda mais ao presente? Apesar das necessárias emendas, achas que o livro, em geral, resistiu bem a passagem do tempo?
Nesta edição tentei sobretudo tirar densidade a algumas partes. De facto, dois capítulos foram reescritos porque não me satisfaziam, não eram diretos. Outro dos focos foi atualizar informações que ficaram desfasadas. Quinze anos dão mais de si desde que existe a Internet.
O livro é atual porque os argumentários, quase sempre lugares comuns, descansam no possibilismo, essa doença de quem ninguém está a salvo seja no âmbito ambiental, de género, político ou qualquer outro. É aquela desculpa de «As cousas deviam ser assim, mas…». A vida social, como se sabe, está cheia de «mas» que a tornam bem mais pobre.
De resto, trabalhamos para que este livro seja desnecessário, que seja visto algum dia com olhos de antropologista e que alguém exclame «como se aborrecia o pessoal. Tantas páginas para dizer obviedades!».
Na tua opinião, quais são as principais mudanças sociolinguísticas que se produziram no País neste tempo?
O processo de substituição linguística está numa fase muito avançada e a ilusão da normalização linguística é cada vez mais evidente para as pessoas interessadas no avanço social da língua. Há cada vez mais meninos a gritarem que o rei está nu apesar dos esforços institucionais por tapá-lo de qualquer maneira. A transmissão intergeracional da língua, de facto, é quase impossível nas zonas mais dinâmicas e povoadas do país, quase todas as cidades com a exceção relativa de Compostela. Querer não chega porque poder não dá.
O reverso desta moeda é uma maior consciência de que a rota oficial leva a um desfiladeiro. Felizmente na estação há mais percursos e a rota internacional, o dito reintegracionismo, ganha cada vez mais viageiros, sobretudo como prática de consumo, não tanto prática escrita ou oral. Desenhos animados para/as crianças, textos traduzidos, sites de consulta, software ou legendagens noutros sabores da nossa língua vão ganhando usos entre galego-falantes, sobretudo neos mas não só. É a semente da esperança.
Portal Galego da Língua, o Novas da Galiza, locais sociais como O Pichel ou Artábria, as escolas Semente… São realidades normalizadoras, socializadoras em galego, que não existiam em 2001…
A Internet é o grande germe normalizador do século XXI, bem como as redes sociais. Em 2015, os 99% dos contactos com o galego internacional são fruto de um clique. Quantas pessoas galegas nas redes sociais não têm um «amigo» ou seguem ou são seguidos por uma pessoa lusógrafa?
Pense-se num lar com TV ou só com a Internet e as possibilidades que oferecem em termos de escolha e de interação linguística cada um deles.
De resto, sem menoscabo para os projetos que citas, todos imprescindíveis, o presente e, sobretudo o futuro, é a Semente. Ou somos capazes de multiplicar muitas vezes o projeto e que alcance todas as escalas educativas ou estaremos a remar contra a maré décadas e décadas até à exaustão. Cria músculo, é certo, mas é bem melhor criar maré ao nosso favor e flutuar. Flutuar tem mais piada.
Muitas pessoas reconhecem em O galego (im)possível um material fulcral para a sua passagem ao que tens denominado «lado escuro» da língua. Como recebes este tipo de comentários?
Eu escrevo para as pessoas curiosas, não para a minha barriga. Esta nova edição nasce precisamente dessa força que criaram em mim as pessoas que abandonaram os Jedi graças a O galego (im)possível. O lado escuro da força sempre oferece mais possibilidades. Em geral, tudo o que escrevim e escrevo é para tornar evidente o que as instituições teimam em ocultar: temos uma língua internacional em que podemos nadar. O castelhano é uma riqueza mas não tem que ser incontornável.
A bibliografia da segunda edição é muito alargada, com 337 referências. Destas, 20 correspondem a artigos ou livros produzidos nesta década e meia. Ainda, dessa cifra, 75% correspondem-se com os últimos cinco anos. Intensificou-se neste lustro o debate sobre a identidade do galego?
Houvo uma mudança importante, uma maior naturalização da escrita lusógrafa nos âmbitos galeguistas. Isto é evidente nos comentários de sites como o Praza ou o Sermos. Muitos deles são escritos seguindo um modelo galego-português e não raro é um utente do galego-castelhano o que torna efetiva a Lei do Berto. Em geral, a ortografia portuguesa está a ganhar naturalidade.
O que também noto é uma vontade cada vez maior de saber. Locais sociais que pedem palestras ou as vendas da coleção Através da Língua, que soma 15 títulos, são alguns indícios. O debate público, sobretudo pola não comparecência de uma das partes, continua infelizmente ermo. Felizmente temos a Internet para o diálogo, que sempre pode acabar num encontro ao vivo e uma cerveja nas mãos.
E precisamente é nestes últimos cinco anos que se deram os trabalhos que confluíram na aprovação, em 2014, da Lei Paz-Andrade. Imaginavas, naquele já longínquo 2001, que um dia o Parlamento da Galiza aprovaria por unanimidade uma lei, nascida da sociedade civil, para a promoção do português na Galiza e o reforçamento dos vínculos com a Lusofonia?
Sou por natureza otimista e imagino, em menos de 7 anos, algum tipo de reconhecimento oficial do português na Galiza, num estatuto menor mas oficial.
A ILP conseguiu essencialmente elevar o patamar de debate. Deixa de ser só um debate nas margens para ganhar certa centralidade. O aspeto negativo é que é uma lei daquelas que o governo tolera mas não promove. Em 2015 nem 10% dos centros galegos de secundário têm alguma turma de português. Na Extremadura mais de 50%. Sendo que a língua portuguesa nasceu na Galiza e o que falamos é um eco desse facto histórico, podemos falar de uma “grande” gestão.
Nesta segunda edição comentas, sobre a dita Lei, que pode servir para contornar o debate normativo, para dar o ponto final ao confronto de isolacionistas contra reintegracionistas. É, pois, uma mudança de paradigma?
Três décadas de estratégia autonomista desvendaram dous factos importantes. O primeiro é que o galego ILG-RAG não se vai tornar galego-português. Está para ficar sendo o que é, um modelo de língua equidistante entre o castelhano e o português. Glotopoliticamente interessa que seja assim. Nem se quer nem interessa que isso mude.
O segundo é que o reintegracionismo, apesar de não gozar da bênção institucional e dos seus capitais, cresce na mesma e produz com qualidade como é caso dos projetos que citavas anteriormente.
Viram-se assim frustradas duas esperanças, que o galego ILG-RAG escorregasse para o português e que o reintegracionismo desaparecesse. Vãs esperanças.
Estes dous factos, se o que nos guiar a todos é o avanço social da língua da Galiza, obriga a parar a pensar. Devemos construir um ambiente onde ambas a estratégias somem; um novo consenso, portanto. Esta é tarefa das gerações mais novas. Incluo-me.

Ato no Festigal

Conforme indicado na Agenda do PGL, no dia 25 de julho decorrerá um ato de assinamento de exemplares de O galego (im)possível. Será na sequência do Festigal, em Santiago de Compostela.

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