Uma quantidade imensa de pesquisas, surgidas de diversos quadrantes, inclusivamente da academia, colocam a questão ambiental entre as cinco maiores preocupações atuais da humanidade. Por Júlio Ottoboni.
Há momentos que esta alcança o terceiro lugar neste ranking,
e só é superada por questões mais diretamente ligadas ao quotidiano
humano, como a insegurança e a economia. Embora esses estudos apontem a
saúde do planeta como algo crucial, ela é –sem dúvida – a que menos
recebe atenção e intervenções diretas, tanto por parte de governos como
da própria sociedade.
O jornalismo sob enfoque tanto científico como o ambiental - este último muito mais organizado nas suas relações- esforça-se para colocar uma lupa e, por vezes, uma lente macro em ações pontuais na esperança de sensibilizar as pessoas sobre ações positivas. Ou parte para exemplos trágicos como os fenómenos extremos, geralmente ligados ao clima. Mesmo com esse esforço comunicacional, nota-se que entre a sensibilização e a ação prática há um abismo, além do perigo de alicerçar de vez a zona de conforto de muito inativos ambientalmente.
Há um latente analfabetismo ambiental e científico que é essencial para que os barbarismos da antropização no meio ambiente natural acabem mitigados pelos próprios média ao apresentar soluções individuais, de pequeno alcance. A resposta inconsciente – ou mesmo consciente – é simplória e indolente: já existe gente a trabalhar nesta mudança planetária. Como se isso aplacasse a culpa e, principalmente, a inoperância de grande parte da sociedade.
O homem ainda não se apercebeu do óbvio, o risco de extinção também envolve a própria espécie. Ele passará e permanecerá sobre o modificado planeta como um registo fóssil, unindo-se assim aos seres marinhos, aos grandes répteis, aos dinossauros e a megafauna – a qual incluiu diversos mamíferos. Em 500 milhões de anos de evolução da vida planetária e de extinções em massa (aniquilações essas ocorridas diariamente em menor escala), a melhor definição do que venha ser a espécie humana vem do jornalista da BBC e naturalista David Attenborough: “ Somos muito mais filhos de desastres naturais que da própria evolução natural”.
Para uma parcela da população, a procura de informações ambientais cresce proporcionalmente em relação à sua importância e gravidade. O assunto ganha espaço desde os debates académicos até às conversas de mesa de bar, criando um paradoxo no mínimo curioso: a humanidade necessita da informação, de compreendê-la dentro de uma linguagem acessível ao leigo, mas não está disposta a assumi-la. Definir um preço, como qualquer outro produto informativo. Os sites e publicações especializadas no tema vivem à mingua para se manterem e diversos já encerraram suas atividades.
A sociedade, na sua esquizofrenia mercantilista, paga altos valores, por meio direto ou indireto, para ter informações de ordem económica. Mas não parece disposta a fazer o mesmo pela ambiental. Para a maioria preocupada com a situação planetária (embora haja uma significativa parcela que nem sequer está atenta à gravidade do quadro) compreender o alerta sobre a elevação de um ou dois graus centígrados na média térmica mundial pode esfacelar dramaticamente esse modelo económico. Mais difícil ainda se se aperceber que as estruturas sociais se transformaram em questões de dias ou mesmo de horas, num colapso fatal.
Vários acreditam na figura de um Deus redentorista, difundido pelas religiões monoteístas. Os mais pragmáticos procuram as respostas em governantes com ares messiânicos no universo da política. Ou no empresariado ávido por ser o timoneiro da construção de uma nova ordem mundial. Em todos esses casos há a redenção dos desastres ambientais provocados pelo homem e a perpetuação do homem como espécie soberana sobre os demais seres vivos e numa tentativa fracassada – e hoje entendida como suicida – de controlar o planeta.
Só haverá real esperança em alterar a dramática situação planetária quando o volume de conhecimento e de informações cruciais destinadas à criação de uma massa crítica saltar das dissertações e teses, pesquisas mantidas sob o anonimato e estudos, inclusivamente inconclusivos, deixarem o mofo dos seus escaninhos e bibliotecas e saltaram para a democratização do conhecimento.
Enquanto o império do egoísmo, fomentador de sistemas enclausurados e sectários, não superar essa falta de visão universal estamos fadados a sermos os autores da mais cruel e programada extinção em massa do que chamamos hoje de Terra.
Publicado no site Envolverde em 11 de agosto de 2016
Júlio Ottoboni é jornalista diplomado, tem 31 anos de profissão, foi da primeira turma de pós-graduação de jornalismo científico do Brasil, atuou em diversos veículos da grande imprensa brasileira, tem cursos de pós-graduações no ITA, INPE, Observatório Nacional e DCTA. Escreve para publicações nacionais e estrangeiras sobre meio ambiente terrestre, ciência e tecnologia aeroespacial e economia. É conselheiro de entidades ambientais, como Corredor Ecológico Vale do Paraíba, foi professor universitário em jornalismo e é coautor de diversos livros sobre meio ambiente. É colaborador Attenborough fixo da Agência Envolverde e integrante da Rebia.
O jornalismo sob enfoque tanto científico como o ambiental - este último muito mais organizado nas suas relações- esforça-se para colocar uma lupa e, por vezes, uma lente macro em ações pontuais na esperança de sensibilizar as pessoas sobre ações positivas. Ou parte para exemplos trágicos como os fenómenos extremos, geralmente ligados ao clima. Mesmo com esse esforço comunicacional, nota-se que entre a sensibilização e a ação prática há um abismo, além do perigo de alicerçar de vez a zona de conforto de muito inativos ambientalmente.
Há um latente analfabetismo ambiental e científico que é essencial para que os barbarismos da antropização no meio ambiente natural acabem mitigados pelos próprios média ao apresentar soluções individuais, de pequeno alcance. A resposta inconsciente – ou mesmo consciente – é simplória e indolente: já existe gente a trabalhar nesta mudança planetária. Como se isso aplacasse a culpa e, principalmente, a inoperância de grande parte da sociedade.
Vivemos a dicotomia do "precisamos mudar, mas, por favor, não altere nada"A situação piora se isso mexer com algum interesse particular ou com a alteração do status quo do indivíduo. Vivemos a dicotomia do “precisamos mudar, mas, por favor, não altere nada”.
O homem ainda não se apercebeu do óbvio, o risco de extinção também envolve a própria espécie. Ele passará e permanecerá sobre o modificado planeta como um registo fóssil, unindo-se assim aos seres marinhos, aos grandes répteis, aos dinossauros e a megafauna – a qual incluiu diversos mamíferos. Em 500 milhões de anos de evolução da vida planetária e de extinções em massa (aniquilações essas ocorridas diariamente em menor escala), a melhor definição do que venha ser a espécie humana vem do jornalista da BBC e naturalista David Attenborough: “ Somos muito mais filhos de desastres naturais que da própria evolução natural”.
Para uma parcela da população, a procura de informações ambientais cresce proporcionalmente em relação à sua importância e gravidade. O assunto ganha espaço desde os debates académicos até às conversas de mesa de bar, criando um paradoxo no mínimo curioso: a humanidade necessita da informação, de compreendê-la dentro de uma linguagem acessível ao leigo, mas não está disposta a assumi-la. Definir um preço, como qualquer outro produto informativo. Os sites e publicações especializadas no tema vivem à mingua para se manterem e diversos já encerraram suas atividades.
A sociedade, na sua esquizofrenia mercantilista, paga altos valores, por meio direto ou indireto, para ter informações de ordem económica. Mas não parece disposta a fazer o mesmo pela ambiental. Para a maioria preocupada com a situação planetária (embora haja uma significativa parcela que nem sequer está atenta à gravidade do quadro) compreender o alerta sobre a elevação de um ou dois graus centígrados na média térmica mundial pode esfacelar dramaticamente esse modelo económico. Mais difícil ainda se se aperceber que as estruturas sociais se transformaram em questões de dias ou mesmo de horas, num colapso fatal.
A sociedade, na sua esquizofrenia mercantilista, paga altos valores, por meio direto ou indireto, para ter informações de ordem económicaExiste aí um autismo das sociedades urbanas movidas pelo consumo apregoado por uma economia desenfreada, autofágica e narcisista. Sem a compreensão devida do problema e sentindo os feitos do colapso abre-se espaço para o surgimento de salvadores do mundo, que se utilizam da prostração geral, para difundir seus discursos céticos e redentoristas, livrando as culpas da humanidade no seu rasto de atrocidades.
Vários acreditam na figura de um Deus redentorista, difundido pelas religiões monoteístas. Os mais pragmáticos procuram as respostas em governantes com ares messiânicos no universo da política. Ou no empresariado ávido por ser o timoneiro da construção de uma nova ordem mundial. Em todos esses casos há a redenção dos desastres ambientais provocados pelo homem e a perpetuação do homem como espécie soberana sobre os demais seres vivos e numa tentativa fracassada – e hoje entendida como suicida – de controlar o planeta.
parte do segmento científico procura desqualificar os movimentos ambientais num exercício de supremacia, num distante e obtuso discurso de decanos da erudiçãoPara completar o cenário, parte do segmento científico procura desqualificar os movimentos ambientais num exercício de supremacia, num distante e obtuso discurso de decanos da erudição. Os pesquisadores diminuíram sensivelmente a divulgação de informações científicas e poucas vezes estabelecem vínculos entre os seus trabalhos e de colegas ‘concorrentes’. Infelizmente essa ainda é uma prática comum no meio académico e tão provinciana quanto às tiranias do conhecimento que condenaram Galileu, Pasteur, Darwin e uma infinidade de outros que ousaram enfrentar as organizações detentoras do saber.
Só haverá real esperança em alterar a dramática situação planetária quando o volume de conhecimento e de informações cruciais destinadas à criação de uma massa crítica saltar das dissertações e teses, pesquisas mantidas sob o anonimato e estudos, inclusivamente inconclusivos, deixarem o mofo dos seus escaninhos e bibliotecas e saltaram para a democratização do conhecimento.
Enquanto o império do egoísmo, fomentador de sistemas enclausurados e sectários, não superar essa falta de visão universal estamos fadados a sermos os autores da mais cruel e programada extinção em massa do que chamamos hoje de Terra.
Publicado no site Envolverde em 11 de agosto de 2016
Júlio Ottoboni é jornalista diplomado, tem 31 anos de profissão, foi da primeira turma de pós-graduação de jornalismo científico do Brasil, atuou em diversos veículos da grande imprensa brasileira, tem cursos de pós-graduações no ITA, INPE, Observatório Nacional e DCTA. Escreve para publicações nacionais e estrangeiras sobre meio ambiente terrestre, ciência e tecnologia aeroespacial e economia. É conselheiro de entidades ambientais, como Corredor Ecológico Vale do Paraíba, foi professor universitário em jornalismo e é coautor de diversos livros sobre meio ambiente. É colaborador Attenborough fixo da Agência Envolverde e integrante da Rebia.
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